A bailarina que mora em mim

Menina, eu queria ser bailarina. Poucos anos depois, conheci o jazz. No começo da adolescência, o sapateado me encantou. Jovem, por que não a dança do ventre? Adulta, eu reencontrei a menina e finalmente me tornei bailarina.

Nove anos se passaram desde a minha primeira sapatilha. É muito? Para o ballet, quase nada. Trezentos anos de existência em relação a nove anos de experiência é uma sábia senhora diante de uma recém-nascida.

Passei por várias fases ao longo desses anos. Do “finalmente eu consegui fazer ballet” para o “eu nunca vou conseguir dançar ballet”. Da alegria das primeiras descobertas à tristeza de não conseguir consolidá-las. Reconhecer-se bailarina, sempre amadora, sempre nos palcos diante dos conhecidos, sempre entre quatro paredes. Nunca profissional, nunca para a plateia, nunca para o mundo.

As dores? Sejam do ballet, sejam da vida, sejam da saúde. Convivi com todas elas nesses anos. O meu corpo titubeou tantas vezes. Eu voltava, ele dizia, “Vamos parar um pouco?”. Eu fazia as suas vontades, depois, retornava às minhas. Assim, ouvia, “Não estou aguentando, por favor, mais um descanso”. Até que o entendi, ele tem os seus limites, mas para dançar bem, eu deveria ultrapassá-los todos. Na queda de braço entre o ballet e a minha saúde, ouvi os pedidos do meu corpo, porque sem ele eu não existo, eu não sinto, eu não danço.

Mas a dança precisa continuar. Há tantas formas de dançar. Há tantas formas de dançar ballet, mas isso ninguém nos diz, essa é a nossa descoberta. Existe o ballet dos grandes palcos, o ballet das primeiras-bailarinas, o ballet dos estúdios, o ballet nosso de cada dia. Aquele que eu danço, dia sim outro também, sozinha, para mim, sem que alguém veja, sem que ninguém perceba, sem que todos saibam. Eu danço, sempre. Eu danço ballet, sempre.

Não tenho na minha vida o ballet que eu queria, mas tenho o ballet que eu posso ter. Seria eu menos bailarina?

Ninguém precisa responder. Eu sou bailarina, do jeito que consigo ser.

Parabéns pelo nosso dia!

10 comentários sobre “A bailarina que mora em mim

  1. Cássia, muito obrigada pelo lindo texto!!! Amei de paixão! Quero imprimir ele e pendurar na minha parede. Me identifiquei muito com vários trechos, mas em especial este aqui: “Não tenho na minha vida o ballet que eu queria, mas tenho o ballet que eu posso ter. Seria eu menos bailarina?”. É uma dúvida eterna minha, mas a resposta é: CLARO QUE NÃO! Em um texto do Lucas Splint também sobre o dia da bailarina, ele diz que uma vez que somos tocados pelo ballet clássico, nunca mais voltaremos a ser pessoas “comuns”.
    Um grande beijo.

    1. Sarah, dá para fazer um quadrinho com esse trecho, para você lembrar disso sempre. 🙂 Grande beijo!

  2. Lindo texto! É isso mesmo. O balé não está só no palco com as grandes companhias, não podemos confundir. Essa é uma das expressões dele. Mas quem ama o balé e o vive no dia a dia é bailarina sim!

    1. Bárbara, o ballet está no mundo de diversas maneiras, mas nem todas as pessoas enxergam dessa maneira, infelizmente. Grande beijo!

  3. Você sempre colocando pra fora tudo aquilo que uma bailarina quer falar, ouvir …. Desde que voltoi para o Ballet me identifico com suas palavras. Gratidão e parabéns pelo nosso dia!

    1. Juliana, há dias em que estou mais inspirada e surgem textos assim. Fico feliz que você se identifique tanto. Parabéns para nós! Grande beijo.

  4. Cássia,

    Que bom que o dia da bailarina é o mesmo dia do profissional de Educação Física.
    Eu não sabia deste belo casamento. Republiquei no Twitter da Contemplo, passa lá prá ver…

    Bjs.

    1. Alexandre, eu não sabia que ambos eram comemorados no mesmo dia! Eu acho ótimo, um complementa o outro. Beijos!

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